O estuprador do bairro São Luiz
Nos anos oitenta poucos homens eram mais temidos e odiados em Itu, do que José Carlos Furquim. Com um olhar frio e penetrante, capaz de causar calafrios em suas vítimas, Furquim, como era mais conhecido, flertou com o mundo do crime desde a adolescência. Pequenos assaltos, agressões e drogas eram freqüentes em sua vida desregrada. Mas foi como assassino e estuprador que ele ficou famoso. Em 1982, com apenas 24 anos, assassinou sua própria mulher a machadadas. Foi sua estréia na cadeia. Mas não ficou muito tempo preso. Nos oito anos seguintes, ele seria preso e solto várias vezes acusado de agressões e estupros.
Em 1984, quando ele estava solto em regime de condicional, tendo que voltar a dormir na cadeia todos os dias, tornou-se o principal suspeito dos estupros seguidos de mortes, das garotinhas Silvia Aparecida do Espírito Santo, de 9 anos, e Izabel Bezerra da Silva, de10 anos. Os crimes haviam ocorrido naquele ano. Furquim estava no topo da enorme lista de suspeitos do investigador da Polícia Civil - Dimas de Cavalli, que morreria em janeiro de 1985, vítima de um acidente automobilístico. Uma das meninas mortas tinha o corpo todo cheio de mordidas. Segundo o legista que fez a autópsia da menina, na presença do então aplicado delegado dr. Cirineu Alves de Lima e do investigador Dimas, o assassino tinha falhas nos dentes da frente. Dimas, que já conhecia o perfil psicológico de Furquim e sabia que ele era estuprador, deduziu imediatamente que a possibilidade dele ser o assassino era grande, principalmente por ele ter as falhas nos dentes da frente e morar há menos de mil metros da casa de uma das meninas assassinadas. Preso e interrogado por Dimas e pelo doutor Cirineu, Furquim, negou a autoria desses assassinatos. Admitiu que já havia estuprado antes, mas contou que nada tinha ver com esses dois casos. Foi liberado por falta de provas, e continuou sua onda de crimes nos bastidores. Vez ou outra, estuprava uma mulher ali e aqui, mas por medo de morrer, raramente as vítimas o denunciavam, e com isso ele permanecia em liberdade.
No final dos anos oitenta, sem que ele sequer imaginasse sua onda de crimes estava chegando ao fim. Naquela época ele já havia ganhado status de lenda urbana . “Se você ficar na rua, o Furquim vai pegar te pegar”, diziam alguns pais para seus filhos. Ele era o Bicho Papão do bairro São Luiz (onde morava). Temido até mesmo por muitos de seus comparsas do mundo do crime, que o consideravam um homem agressivo e perversamente brutal.
Em agosto de 1990, Furquim ainda estava de albergue devido a suas pendências judiciais. Sem qualquer aviso ele parou de ir dormir na cadeia, tendo ficado desaparecido por cerca de trinta dias. Exatamente neste período uma menina de 15 anos compareceu em deplorado estado físico e emocional na delegacia da Polícia Civil. Contou que tinha apanhado muito e sido estuprada por um maníaco. A descrição do atacante fornecida por ela batia exatamente com Furquim. A foto do suspeito foi trazida até ela que o reconheceu sem nenhuma dúvida. O mandato de prisão contra Furquim saiu imediatamente e em pouco tempo ele foi localizado e preso. Assim que entrou na prisão, a suspeita dele ter matado as duas meninas veio à tona. Muitos ex-policiais e ex- presidiários se lembram claramente do que aconteceu naquela macabra manhã de 15 de setembro de 1990. Furquim estava no pátio tomando banho de sol, quando foi abordado por outros detentos. Interrogado sobre as mortes de Silvia e Izabel, novamente negou o fato. Por mais que andem a margem da lei, criminosos odeiam estupradores, mas Furquim acreditava que sua fama de perigoso lhe daria segurança na cadeia. Ele estava errado. Mortalmente errado. Dezenas de presos movidos por instinto assassino partiram para cima dele, determinados a arrancar uma confissão a qualquer custo. Furquim, que sempre escapava da justiça de Deus, estava agora sendo julgado pelos homens. Os presos, sedentos de sangue queriam que ele confessasse que havia estuprado e matado as duas garotinhas. Quanto mais negava, mais apanhava. O que era uma surra acabou se transformando em um linchamento implacável. Percebendo que seria espancado até a morte se não admitisse os crimes, Furquim teria confessado os assassinatos, segundo declarações dos presos. Foi após esta confissão que um preso conhecido pela alcunha de “Bica”, que morreria tempos depois vítima de uma grave doença , pegou um botjão de aço, usado para transportar leite e desferiu um golpe fatal na cabeça de Furquim. Seu crânio foi massacrado na hora, tornando seu rosto irreconhecível.
Satisfeitos com a justiça que haviam praticado, os detentos voltaram para suas celas, deixando um cadáver estendido no pátio lavado com sangue. O mais irônico era que depois de uma vida inteira escapando quase sempre impune dos crimes que havia cometido, Furquim foi julgado, condenado e morto, exatamente por dois crimes que não cometeu. Enquanto ele era violentamente espancado na cadeia o verdadeiro assassino de Silvia e Izabel estava vivo perambulando tranqüilamente pelas cidades vizinhas, à procura da próxima vítima. Mas, esta já é outra história ...